Um dos temas mais comentados, e criticados, no futebol brasileiro, é a organização de seu calendário. São muitos campeonatos simultâneos, excesso de jogos sem interesse, falta de respeito às chamadas "Datas Fifa", onde a seleção faz compromissos oficiais, entre outras mazelas.
Como o calendário é organizado hoje?
Considerando o futebol paulista como exemplo, um time que se classifique para a final do campeonato fará 23 jogos nesta competição: 19 num turno único, onde se classificam 8 times em 20, e 4 num torneio de mata-mata com 2 fases com jogo único, e a final em 2 jogos.
Se a mesma equipe estiver classificada para a Libertadores da América, que ocorre em boa parte em paralelo aos estaduais, e chegar a final deste torneio, ela fará 14 jogos. Ou fará no mínimo 6, se for eliminada na primeira fase. Se participar da pré-Libertadores, são mais 2 jogos.
No principal campeonato do país, o Brasileirão, temos fixos 38 jogos para cada time, tanto na série A quanto na série B. Neste caso, como o sistema de disputa é por pontos corridos, sem uma fase mata-mata na final, não há diferença na quantidade de jogos do time campeão para o time que ficar na última posição.
Na Copa do Brasil, serão até 14 jogos para os times que não disputam a Taça Libertadores da América, e até 8 jogos para os times que disputam a Libertadores da América. Na copa Sul Americana, temos até 4 jogos para o time que chegar até a final, mas como o time que estiver na fase final da Copa do Brasil não disputa a Sul Americana, a quantidade de jogos é a mesma de quem fosse até a final da Copa do Brasil.
Finalmente, para os campeões da Libertadores e da Sul Americana do ano anterior, temos a disputa da Recopa Sul Americana, em 2 jogos. O campeão da Libertadores, ainda, no mesmo ano em que foi campeão, disputa, no final da temporada, o Campeonato Mundial da Fifa, também em 2 partidas (semifinal e final, ambas em jogo único).
Fazendo a soma, considerando o pior caso: 23 partidas no estadual, 14 na Libertadores, 38 no Campeonato Brasileiro, 8 na Copa do Brasil, 2 na Recopa e 2 no Mundial da Fifa, temos 87 jogos na temporada. Ou até 89, se o time for Campeão da Sul Americana do ano anterior e tiver que passar pela Pré-Libertadores.
E qual o resultado, com o calendário atual?
O resultado é o desinteresse, a fadiga e o stress de alguns jogadores, times menores, sem condição de revezar os jogadores, sofrendo com sucessivas contusões e com performances ruins ao longo da temporada. Além disso, os times que possuem jogadores que são frequentemente convocados para a Seleção Brasileira também sofrem com a ausência dos principais nomes nas partidas, pois os campeonatos nacionais não param nas datas em que há jogos da seleção marcados.
E quais as mudanças que deveriam ser implementadas?
Não há mudança no calendário que resolva com este número de jogos. A primeira mudança necessária é enxugar o número de partidas que um mesmo time deve fazer, e a outra é adequar o calendário para o chamado calendário europeu, ou calendário mundial, pois são poucos os países que, a exemplo do Brasil, não tem a temporada fasada com a temporada europeia.
Para diminuir o número de jogos, as mexidas deveriam ocorrer, principalmente, no âmbito nacional. Deveríamos aproximar nosso calendário do calendário europeu, onde um time disputa, considerando campeonatos mais longos, um campeonato nacional em pontos corridos, 1 (ou 2) copas nacionais, como ocorre na Inglaterra, e um campeonato continental.
Para isto, deveríamos eliminar os estaduais. Isto não quer dizer substituí-los, como já foi feito há algum tempo, pelos regionais (Rio-São Paulo, Copa Nordeste, Sul-Minas, etc.), pois não há a redução esperada de partidas.
No caso da Copa do Brasil, deveria ser adotado o modelo da Copa da Inglaterra: todos os jogos deveriam ser feitos em partida única, no local a ser designado por sorteio. Lá é reservada uma segunda data para que seja disputada uma partida desempate, na casa do visitante da primeira partida, caso não tenha existido um vencedor. Desta maneira você não diminui a quantidade possível de jogos, mas isto ocorrerá em pouquíssimos casos.
No caso do calendário, o ideal seria concentrar as férias dos jogadores no mês de Junho, como é feito no restante do mundo. Assim, o mês de Julho serviria como pré-temporada, para que os times pudessem treinar aqui (ou no exterior), fazendo as excursões que ouvimos que existiam no passado e que já não existem mais, e se preparando para o início do Campeonato Brasileiro.
Este deveria ser iniciado no mês de Agosto, e terminado em Maio do ano seguinte. Seria um campeonato disputado ao longo de toda a temporada, ocorrendo, principalmente, nos finais de semana, e reservando o meio da semana para disputa das copas continentais ou da Copa do Brasil.
No aspecto continental, a Sul Americana deveria ocorrer em paralelo com a Libertadores, como ocorre na Europa entre a Liga Europa e a Champions League. Pode até ser feita alguma mistura entre as duas, os times com melhor campanha entre os que foram desclassificados na primeira fase da Libertadores poderiam entrar na segunda-fase da Sul Americana. Pelos comentários, há interesse da TV americana pela participação de seus times na Libertadores também, e estes campeonatos poderiam abranger todo o continente, sem discriminar os participantes da América do Norte, que deveriam se credenciar para o Campeonato Mundial da Fifa a partir da Libertadores, para que não joguem, em alguns casos, com time reserva neste torneio por privilegiar outro.
Além desta mudança, tanto o torneio Continental como a Copa do Brasil deveriam ocorrer ao longo do ano todo, e não apenas em um semestre. Ambos começariam em no segundo semestre de um ano, e terminariam em Maio do ano seguinte.
E o que fazer com os times menores, que hoje vivem dos campeonatos estaduais, por 3 ou 4 meses ao longo do ano, e depois não tem muito o que fazer no restante do ano? O ideal seria haver torneios de várias séries, conforme o número de times de cada estado, cada uma classificando para a série imediatamente seguinte, e os melhores da última série do campeonato estadual se classificariam para a série D do Campeonato Brasileiro do ano seguinte. Se todos os campeonatos, inclusive os estaduais, nas diversas séries, fossem disputados ao longo da temporada toda, e servissem sempre como classificatórios para uma série seguinte, ou para um Campeonato Brasileiro, você teria os atletas sempre ocupados durante o ano todo.
Desta maneira, se um time disputasse todos os jogos do Brasileiro + Libertadores (ou Sul Americana) + Copa do Brasil (se fossem adotadas 7 fases para todos, com 1 jogo por fase) no ano, seriam 59 partidas. Para o time que disputasse ainda a Recopa e o Campeonato Mundial de Clubes, no máximo 63 partidas. Muito mais razoável, mais fácil para distribuir ao longo do ano, respeitando as chamadas "Datas Fifa", e mais rentáveis para os times, que com menos jogos conseguiriam ter um público médio melhor nas partidas.
E por que esta mudança não é feita?
E por que algo assim, que parece ser mais razoável, não tem um horizonte próximo para ocorrer no Brasil? Por conta da concentração do poder de decisão sobre isto na mão de algumas pessoas que se sentiriam prejudicadas com o fim dos Estaduais. Esta decisão deveria partir da CBF, que parece ter como único interesse, além do financeiro, a continuidade no poder. E hoje, o presidente da CBF é eleito por um colégio de 47 pessoas: o presidente de cada um dos 20 clubes que está na série A do Campeonato Brasileiro e os 27 presidentes das Federações Estaduais, que sobrevivem dos falidos campeonatos estaduais.
E não há nada que nós, meros mortais e cidadãos comuns, possamos fazer?
Existem vários protestos rolando pela Internet, na chamada militância de sofá, onde você protesta pelo facebook, participa dos abaixo assinados e nada acontece além disso.
Há protestos feitos nas ruas, tanto no Rio quanto em São Paulo, mas o número de pessoas que participam é muito pequeno, e não há a repercussão que deveria haver neste caso.
A única maneira que enxergo é a financeira: se você deixa de frequentar os estádios durante os estaduais, há um impacto direto nas finanças do clube, o que diminui o interesse deles. Se você assina o pay-per-view neste período, para poder acompanhar os estaduais, cancele sua assinatura, pois além de economizar você estará diminuindo a receita da TV e dos clubes, diminuindo o interesse também aí.
Finalmente, e o mais difícil, se você deixar de ver os jogos pela TV e de acompanhar o noticiário dos clubes durante este período, causará um impacto maior na imprensa e também nos clubes. Quem sabe assim, com um campeonato regional sem interesse financeiro, o que é mais razoável consiga ser realizado?
Abraços,
Henri